Às vezes acordo com uma profunda sensação de pressa. Como se, do nascer do dia ao bater das doze badaladas da meia-noite, tudo fosse uma espécie de dança cósmica sob a batuta de um ponteiro de relógio. E nem posso dizer – como o Vinicius – que “minha existência sem ti, é como olhar para um relógio apenas com o ponteiro dos minutos”.
Tenho pressa, confesso. Tenho pressa de amar – antes que morra em mim a poesia. Tenho pressa de me lambuzar na lua cheia – antes que sucumba o adolescente eternamente apaixonado pelas coisas belas da vida. Tenho pressa de apreciar o quadro do Olavo na parede da sala – antes que me desapareça a ternura pelo azul. Tenho até pressa – caramba! – de escrever meu último poema (o tal que será um panfleto, para que depois possa seguir em paz com os deuses todos cá da freguesia), de rabiscar meu último discurso, de assobiar minha última canção aqui na varanda com o velho violão a tiracolo.
Já me dizia em tempos o Aristides, que em mim tudo foi precoce, tudo é precoce: o primeiro choro, as primeiras letras, o primeiro canudo, a primeira aliança, o primeiro adeus, e até o primeiro silêncio entre quatro paredes sós. No meio de duas gargalhadas, ficou o arrepio pela espinha. Será também precoce – chiça! – a partida e o tal desejo de fugir?
Talvez por isso, este relógio a martelar-me incessantemente o ombro esquerdo. Compreendes agora, minha amiga, esta pressa de amar os teus olhos caboverdeanamente verdes?
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