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Já não aguento mais a porcaria deste ventilador no meu ouvido vruuuum vruuuum vruuuum. Caramba! Levanto-me de um pulo e arranco a ficha da tomada eléctrica sem sequer me dar ao trabalho de o desligar primeiro. Volto a atirar o corpo para cima da cama como um saco de batatas. Estou exausto. De insónia e de ti. Melhor: da lembrança tua. Sustenho a respiração por dois segundos para sentir a suave carícia do silêncio no quarto. A paz que desce sobre mim é aconchegante como o teu abraço pressentido. Meus lábios esboçam um leve sorriso de encantamento – vejo-te pela primeira vez na esquina do Café Sofia no Plateau, uma segunda vez num domingo qualquer na praia de Quebra Canela, e uma terceira vez quando nos encontramos casualmente ali no Sovaco de Cobra numa Sexta-feira à noite e em jeito atrevido te pedi o número do teu telemóvel. Deste-mo.
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Os quadros se intercalam como num filme em câmera-lenta. Passa um carro na madrugada da rua defronte. Instintivamente olho as horas no despertador da mesinha de cabeceira, são duas e dezassete minutos da madrugada. Penso em ti. O verso percorre a minha pele como um arrepio gostoso, de mãos dadas com o pecado e a curvatura dos teus lábios. O calor volta a invadir-me irremediavelmente a alma e a memória. Condensa-se em gotículas de suor que escorrem em direcção ao lençol amarrotado. Viro-me na cama irrequieto. Busco o conforto e o teu corpo. O teu rosto. Os teus olhos.
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Acendo a luz e envio-te um SMS às duas e trinta e nove minutos da madrugada. Sei que vou acordar-te mas delicio-me sadicamente com a tua imagem a abrir os olhos sobressaltada com o sinal de mensagem recebida, o teu corpo a revirar-se na cama para pegar o telemóvel na mesinha de cabeceira. Quase que sinto tua raiva primeiro – quem ê êss filho-da-mãe dêss hora, chiça! Mas o poema te enternece e por entre a raiva e a réstia de sono esboças um pequeno sorriso que me chega até o quarto no outro lado da cidade.
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Volto a ligar o ventilador made in China - já não aguento o calor, porra! Um mosquito vem aos poucos partilhar comigo o fardo desta insónia. Lembro-me que tenho de me levantar às sete da manhã para ir à vida e quase que entro em pânico. Tens que dormir, moço! Fecho os olhos para forçar o sono mas és tu que me abraças entre o calor e estoutro poema. No meu íntimo fico à espera de uma qualquer resposta tua, seguro o telemóvel por alguns minutos na ansiedade do toque que me anunciará tua palavra ou tua voz. Vruuuum vruuuum vruuuum. Não, não é esta a tua voz no outro lado da porta. Ou será do telefone? Já nem sei mais. Teus lábios se diluem gradativamente por entre a realidade e o sonho. Aos poucos vai-se esfumando na noite o barulho do ventilador. Já não sinto. Sonho talvez e nem sei. Liberto-me. Da insónia, do cansaço, do dia longo. Liberto-me. Para ti. Consigo até ver o meu corpo que abandono em posição fetal sobre o lençol amarrotado. Liberto-me para longe nesta minha eterna ânsia de partir. Sinto-me a adormecer lentamente…
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Triiim! Triiim! Triiim! Acordo sobressaltado com o vibrar do telemóvel em cima da mesinha. É ela, certamente, moço! É ela! O coração aos pulos. Tum tum tum. O teu rosto outra vez. Os teus lábios que pressinto acariciando o outro lado da linha. A ansiedade na ponta dos meus dedos. É ela, caramba! – quase que grito no silêncio do quarto. Nem sequer me dou ao trabalho de confirmar o número no visor. Alôô… faço uma voz ligeiramente sensual para te provocar. Silêncio. Alôôôô….
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“- Alô! Ê di squadra de pulícia de Palmarejo?”
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Era engano.
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2 comentários:
Oi Paulino
para ti com poesia de Florbela Espanca:
Beija-mas bem!... Que fantasia louca
Guardar assim, fechados, nestas mãos,
Os beijos que sonhei pra minha boca!...
Oi, "anónimo", obrigado por visitar o blog.
Feche os olhos - o sonho se realizará...
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